20.11.06



olarilolela

na casa verde clara escura
do medo subtraído à praça
plena de pessoas
a regressada senhora afogueada
olha-se ao espelho:
o medo senhor
o medo fidalgo
o medo deus
o medo que a olha do outro lado
e a senhora gelada
na casa verde clara
escura do medo
agora mais calma
eu consigo pensa a senhora
eu consigo pensa o medo

8.11.06



o pintor bonito

a calçada húmida sugere-lhe os edifícios que choram e então ele pensa
muito nos edifícios que choram e nos que não choram e depois prepara
os passeios e as conversas onde o olhar se demora nas margens e com
isto falo do arrebatamento

cristo não jogava andebol e no entanto jogava e por vezes os monólogos
eram fotografias a preto e a branco de jardim ou jasmim consoante o
incrédulo impulso antecipativo: pincéis e mãos cinzelados pela dança
convulsa e certeira

dos sonhos solicitados à agrura dos dias e das noites efectua-se a
divisão correcta e então uma determinada melodia projecta as sombras
das personagens que vão sendo incorporadas e do que sobeja e se deseja
e se implica e levita pode referir-se a lucidez

25.10.06



if

talvez se falasse se mais tarde nós nos
fossemos um pouco mais daqui
e embora para outro lado

se ouvisse se ouvido com atenção que
havia qualquer coisa a mexer com
os nossos braços frágeis mesmo nus
encostados ao peito de um ulterior outono

talvez não te largasse nunca mais dos braços
se dos braços te ao largar te perdesse
e essa fosse a pergunta que me fizesses
e te visse nos nossos olhos a resposta

que haveríamos de sorrir como se houvéramos
gostado muito do abraço de movimentos lentos
de que se falasse se mais tarde nós gostássemos

17.10.06



a van quê?

a vantagem de ventilar
a vânia à vinda de
vâncouver e a vontade
da vanda em vomitar


chuva

da obliquidade
extrair a lucidez

ouvir a lamúria do vento
que anuncia um novo tempo

19.9.06



(nas costas do recibo do multibanco)

a causa da pausa do sousa respeita à dúvida que nele pousa: do modo estanque ao arranque que espreita, quem solicita o que apenas levita?

25.8.06



de olhos fechados

as árvores são sábias no seu quietar
as águas são livres e movimento
eu estou de pé e sonho

12.6.06



cândido ou então rosa maria,

certo certinho é que se via despido.
a sua rata, o seu piçalho?
manda o agasalho
que isto ainda vai lá.

ou então assim:

23.5.06



o rosto do debate

dos cochichos dos jornalistas retenho que "isto vai dar merda", segundo o temeroso ricardo e que "correu bem, correu bem", cálculo de emídio. o pacheco recolheu-se, esperto. o professor carrilho dá aula a ricardo. um bailarico de se lhe tirar o chápéu! que cheirinho a liberdade!

4.5.06



a caca

é de caca este tempo de
caca esta gente de caca estes
dias de caca. acrescente-se
a caca do jornalismo de caca:
resta apenas o silêncio

23.3.06



a pausa

da pausa:

1
Dá-se o impulso para as palavras expulsas, finalmente. Quando se dá, dá-se sempre absolutamente.

O gajo iraniano ameaça. O nuclear francês vocifera. O benfazejo padeiro cumprimenta-me. Aceno. Que vou ali pensar um pouco, engulo. Levo pelo frio a voz da senhora que ouvi na antena dois, um espanto.

Compro café, cigarros. Vejo notícias. A estrábica do sítio refere a possibilidade de partir a cara à sua filha. A dita saltita: e eu parto-te o cu. Devolvo-me ao exterior. Tudo como dantes.

Discutem o país, no aparelho. A nossa identidade. Depois uma espécie de luto tolda-nos uns dias. Ganhou o vácuo. E então, de repente, o clássico dos clássicos! No aparelho. Um modo que basta. Transcende, na verdade. E no entanto, os vermelhos perdem. E agora? Que dias estes…

2
E se mantivesse com um microfone uma relação de amor que me fizesse cantor ocasional, e se pintasse e o fizesse como se apenas isso importasse, e se só a arte importasse e a luz sobre braga, desse o que desse, fosse ar que se respirasse?

A informática veio em pessoa apresentar-se. Tecnológica. Importante. Um senhor sentado a meu lado bebe uma mini e então resmunga-se assim: “Os teus gestos são vastos mas miúdos de imbricamentos, parcos e sobejos mas tão gastos e já lentos”. Acerca da mecânica tenho que dizer ou falar da pintura: vai-se a pé.

O riso é afinal início ou vício ou quase isso, ou então o riso é aos soluços a solução. Um remédio para o tédio, um relógio num refúgio. Isto demorando a água quente e o Wagner sobre mim, medindo o acerto de um anoitecimento possível. Ei-lo, de súbito: livros e pernas cansadas do frio e da espera, um recolhimento mais ou menos pontual e familiar; uma cidade que se distende, outra que se prepara. O termo é em geral o silêncio.

3
Deve ser noite. Morre-se de frio e promete-se vingança. Aqui e ali. Ouve-se um piano. É o piano da embaixada. Deve ser dia. Tempo de atacar, de distrair, um tempo de composição. Sustento, Saber, Saúde, clarifica Agostinho. No outro dia foi Mozart quem me salvou.

Os meus desenhos dão-me muito trabalho, não se metem em facilidades. Demoro assim: o homem nasce para criar e isso basta. Pois. Quem não largava a antena 2 era o Alba, companheiro das rotas de Agostinho. Que a vadiagem, dizia este, é coisa vantajosa. E faz-se de sabedoria.

Consagro que sem apoios, sem contar com a jubilosa alegria dos apoios, é mais penoso, isto. Faz-se o que se pode. Poda-se. Julgo que vou assim, por caminho ínvio e papel impecável. Amanhã o cachorro adormecido à porta da Laura vem viver comigo. O meu animal chega-me desta forma. Como o vou chamar? Agostinho? Da Silva.

3.3.06

ao trigésimo desnorte contentar-te-ás com a brisa: um determinado casaco ao vento sob a noite acertada

15.2.06



ao agostinho da silva

o ideal seria não ser visto
e em terras de sal
e em terras de xisto
não ser visto seria o ideal

3.2.06



psiquiatria

dizer assim: quem sou eu?

24.1.06

o vácuo

diz: está mal. depois: tenho confiança. ganha.

10.1.06



apontamento circunstancial sobre os media

o senhor santana na sic-notícias assume-se senhor sendo o dito santo afinal apenas silêncio. o comando (isto acontece) apagou-lhe a voz. música, pois. ça ira.