23.3.06



a pausa

da pausa:

1
Dá-se o impulso para as palavras expulsas, finalmente. Quando se dá, dá-se sempre absolutamente.

O gajo iraniano ameaça. O nuclear francês vocifera. O benfazejo padeiro cumprimenta-me. Aceno. Que vou ali pensar um pouco, engulo. Levo pelo frio a voz da senhora que ouvi na antena dois, um espanto.

Compro café, cigarros. Vejo notícias. A estrábica do sítio refere a possibilidade de partir a cara à sua filha. A dita saltita: e eu parto-te o cu. Devolvo-me ao exterior. Tudo como dantes.

Discutem o país, no aparelho. A nossa identidade. Depois uma espécie de luto tolda-nos uns dias. Ganhou o vácuo. E então, de repente, o clássico dos clássicos! No aparelho. Um modo que basta. Transcende, na verdade. E no entanto, os vermelhos perdem. E agora? Que dias estes…

2
E se mantivesse com um microfone uma relação de amor que me fizesse cantor ocasional, e se pintasse e o fizesse como se apenas isso importasse, e se só a arte importasse e a luz sobre braga, desse o que desse, fosse ar que se respirasse?

A informática veio em pessoa apresentar-se. Tecnológica. Importante. Um senhor sentado a meu lado bebe uma mini e então resmunga-se assim: “Os teus gestos são vastos mas miúdos de imbricamentos, parcos e sobejos mas tão gastos e já lentos”. Acerca da mecânica tenho que dizer ou falar da pintura: vai-se a pé.

O riso é afinal início ou vício ou quase isso, ou então o riso é aos soluços a solução. Um remédio para o tédio, um relógio num refúgio. Isto demorando a água quente e o Wagner sobre mim, medindo o acerto de um anoitecimento possível. Ei-lo, de súbito: livros e pernas cansadas do frio e da espera, um recolhimento mais ou menos pontual e familiar; uma cidade que se distende, outra que se prepara. O termo é em geral o silêncio.

3
Deve ser noite. Morre-se de frio e promete-se vingança. Aqui e ali. Ouve-se um piano. É o piano da embaixada. Deve ser dia. Tempo de atacar, de distrair, um tempo de composição. Sustento, Saber, Saúde, clarifica Agostinho. No outro dia foi Mozart quem me salvou.

Os meus desenhos dão-me muito trabalho, não se metem em facilidades. Demoro assim: o homem nasce para criar e isso basta. Pois. Quem não largava a antena 2 era o Alba, companheiro das rotas de Agostinho. Que a vadiagem, dizia este, é coisa vantajosa. E faz-se de sabedoria.

Consagro que sem apoios, sem contar com a jubilosa alegria dos apoios, é mais penoso, isto. Faz-se o que se pode. Poda-se. Julgo que vou assim, por caminho ínvio e papel impecável. Amanhã o cachorro adormecido à porta da Laura vem viver comigo. O meu animal chega-me desta forma. Como o vou chamar? Agostinho? Da Silva.

3.3.06

ao trigésimo desnorte contentar-te-ás com a brisa: um determinado casaco ao vento sob a noite acertada